quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Lei "absurda" obriga ao fecho de "A Casa Portuguesa" em Barcelona

Uma "lei absurda" sobre o uso de espaços comerciais no distrito barcelonês de Gracia vai obrigar ao fecho, no fim de semana, sete anos depois da inauguração, da loja "A Casa Portuguesa". 

Termina assim um processo de luta de mais de dois anos contra o polémico plano de usos aplicado pelo distrito municipal de Gracia e que, segundo Pedro Ramos, discrimina entre comerciantes no bairro, dependendo da idade das suas licenças, e entre estes e outros "uma rua ao lado", já noutro distrito.

Ramos afirmou que a decisão de fechar - exatamente no domingo, quando a loja instalada na rua Verdi cumpre sete anos de vida - é irrevogável e que, mesmo que no futuro a lei mude, a "Casa Portuguesa" não voltará àquele espaço.

"Gracia é um mundo aparte em Barcelona. Tem muita independência. Dentro da independência tem ainda mais independência", disse, referindo-se à lei de 2006 que proibia qualquer estabelecimento alimentar de ter degustação no local.

"É um contrassenso. Temos uma licença de pastelaria, mas os clientes não podem lá comer os bolos. E temos licença de vinho mas não podem lá beber", explicou.

A legislação agravou-se há dois anos, obrigando os estabelecimentos nesta situação (sem degustação), e com exceção das pastelarias, a fecharem às 23:00.

"Como temos duas licenças, uma de pastelaria e outra de venda de vinhos, uma tinha que fechar às 11 e a outra não. Ficávamos num limbo", afirmou.

Começou uma fase complicada com visitas da Guarda Urbana e dos inspetores distritais, o que, apesar de processos judiciais e recursos administrativos, não impediu o fecho temporário. Só puderam reabrir depois de retiradas as mesas e cadeiras do local.

Os proprietários regressaram à luta, com uma recolha de assinaturas e a constituição de uma associação de comerciantes afetados, pressões que parecem estar a ter resultados: a lei está a ser revista, mas o processo é complicado e pode demorar, já que se requerem 75% de apoio.

Um prazo demasiado longo para "A Casa Portuguesa" que, caso permanecesse aberta - "não pretendíamos mudar o conceito do espaço" --, poderia levar a mais encerramentos forçados ou a multas que podem ascender aos 60 mil euros.

"Já estamos novamente com um processo de encerramento. Podíamos voltar aos tribunais, mas os advogados acham que no final perderíamos porque a lei que existe é esta", afirmou.
"O risco de continuar a luta com aquilo aberto é muito grande. Pode pôr em causa toda a empresa", acrescentou.

Pedro Ramos recordou que a lei só se aplica a quem tenha solicitado as licenças depois de 2005 -- criando assim concorrência desleal entre os comerciantes da zona -- e não se aplica nas outras zonas da cidade.

"Duas ruas abaixo já se pode servir no interior. É um absurdo mas é a lei. Como muitas outras leis absurdas. Temos que nos sujeitar", referiu.

Desaparece assim um espaço que durante vários anos se consolidou quase como um oásis português no meio culinário e cultural de Barcelona.

Referência na cidade, foi um espaço não só de gastronomia e vinhos, mas de apresentação da cultura e artes portuguesas, seja música, cinema, pintura ou literatura.

Pelo espaço, logo nos primeiros tempos, passaram nomes como Jorge Palma, os The Gift ou os Terracota, livros de José Luis Peixoto e de Teresa Rita Lopes, ou curtas-metragens de jovens realizadores portugueses que vivem em Barcelona.

O projeto continua, para já, através de um espaço aberto em meados do ano passado, noutra zona de Barcelona, e pode, eventualmente -- "se a lei mudar e quando mudar" --, através de um espaço hoje usado para a produção, também permanecer no bairro de Gracia, zona por vezes comparada ao lisboeta Bairro Alto.


Fonte: Jornal de Notícias

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