Na ponta da língua
Regra geral, os produtores dos petiscos caseiros (sejam ovos, frutas ou
queijos) já têm clientes que cheguem e querem tudo menos publicidade.
Vejo-me assim obrigado a comer e a calar, o que vai contra todos os meus
instintos de jornalista.
Esta semana consegui convencer um desses produtores a dar a cara e vou
já dizer os nomes e o número de telefone antes que eles ou eu e a Maria
João nos arrependamos.
São eles que fazem os maravilhosos queijinhos frescos que comemos todos
os dias, ao pequeno-almoço e ao jantar. Há um outro produtor de
excelentes queijinhos frescos na zona de Lisboa mas tem uma produção
limitada que já não chega para as encomendas.
Os queijinhos frescos da Courela do Campo são excepcionais por serem
muito bem feitos pelo mestre queijeiro Rui Romão de leite fresquíssimo
da melhor qualidade. É tudo pasteurizadíssimo e limpíssimo mas o estilo é
o de antigamente. São queijinhos cremosos e pesados que não sabem a
água ou se desagregam, como todos os que para aí há que são feitos a
partir de leite inferior ou mesmo leite em pó. No mundo dos queijinhos,
impera o mesmo princípio teológico que se aplica aos seres humanos: pó
foste, pó serás.
A qualidade e a frescura do leite não são tudo, porém. É preciso
habilidade e bom gosto. Os queijinhos frescos precisam de pressa: têm de
ser feitos depressa e vendidos depressa, enquanto se recomeça a fazer
uma nova leva com o leite novo que entretanto chegou.
Bem transportados e bem preservados, os queijinhos frescos chegam a
durar uma semana no frigorífico. Tem é de se escorrer o soro todos os
dias e, se for caso disso, lavar os queijinhos em água fria.
O meu pai era maluco por queijinhos frescos e fazíamos dezenas de
quilómetros para prová-los. Não havia cara mais decepcionada em Portugal
do que a cara do meu pai se lhe dissessem que tinham acabado os
queijinhos frescos. Quase chorando, insistia sempre em saber "porque é
que me disse? Porque é que me disse?"
Desde a proibição (correcta) de fazer queijinhos frescos com leite cru,
os produtores levaram 20 ou 30 anos para arranjar maneira de fazer
queijinhos frescos igualmente saborosos com leite fresco pasteurizado.
Já provei todos os queijinhos frescos à venda na zona de Lisboa (mesmo
os mais suspeitos) e posso afirmar que os melhores de todos, ao alcance
do público, são os produzidos pela Courela do Campo em Torres Vedras.
Fazem também um queijinho fresco de cabra que é notável por ter
pouquíssimo sal.
O preço deles é cinco cêntimos mais caro do que os queijinhos frescos
que se compram por aí mas a diferença de qualidade sabe mais a cinco
euros do que cêntimos.
Os irmãos Romão, Rui e Jorge começaram a fazer queijinhos frescos em
Reguengos de Monsaraz. O gosto e a vaidade alentejana são elementos
importantíssimos. Hoje produzem os queijinhos em instalações maiores, em
Torres Vedras. Tendo comido diariamente os queijinhos feitos em
Reguengos, posso dizer que nunca encontrei diferença dos queijinhos
feitos em Torres.
Têm os mesmos fornecedores de leite excelente (no sentido literal, de
exceder todos os outros, excepto o leite Vigor) e, claro, são os mesmos
irmãos Romão a tratar de tudo.
Para experimentar os queijinhos deles (têm outros queijos curados,
simples mas impecáveis) terá de contactar um dos armazenistas. Não é a
maneira mais fácil de comprar queijinhos mas pode comprar uma semana
inteira de cada vez.
Os armazenistas abaixo indicados dir-lhe-ão quais as lojas que fornecem
que estão mais perto de si. Nós, por exemplo, fazemos quarenta
quilómetros todas as semanas para nos abastecermos. E juro que os irmãos
Romão nunca me ofereceram (ou tentaram oferecer) um único queijinho. É
gente séria e de boa fé, ao contrário dos queijinhos que são fofinhos,
acetinados e francamente irresistíveis. Mau, que já estou a dar fome a
mim próprio - e ainda há bocado comi dois deles.
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