Duas mãos cheias de novos quiosques modernos que revitalizam  o espaço. Reabriu ontem e é coisa para lançar uma nova moda
Caro
 leitor, permita-nos a intromissão nos seus botões, mas este é um 
exercício indispensável à compreensão da temática: quais são as duas 
primeiras coisas em que pensa quando se diz a palavra "mercado"? Pois 
claro, cheiro a peixe e gente a gritar pelos fregueses. Talvez ao 
fim-de-semana a conversa seja outra mas a inexistência destes dois 
requisitos pode ser perturbadora. Porém, o princípio do "aqui há de 
tudo" não falha neste renovado Mercado de Campo de Ourique, em Lisboa.
Das
 leguminosas aos torresmos e às guloseimas, gente nova de avental e as 
mesmas luvas de plástico descartáveis nas mãos enrugadas de quem já não 
sabe ter outra vida. O Mercado de Campo de Ourique ganha agora um novo 
rosto com uma série de quiosques e tasquinhas, mas nem por isso põe de 
parte os que aqui já tinham raízes. Tudo resultado de um projecto de 
renovação (depois de um concurso aberto pela autarquia) que pretende 
atrair mais gente, com gostos distintos (à imagem de espaços semelhantes
 como os que se encontram em Madrid ou Barcelona). Fizemos um passeio 
matinal por bancas que não costumam habitar estes territórios. E estas 
são apenas amostras.
Estacionámos o caderno logo à entrada, na 
Charcutaria Lisboa, aventura que começou apenas há três semanas, sem 
grande preparação. "Estive 6 meses no Brasil e agora não sabia bem se 
regressava para lá ou se ficava. Em conversa com uns amigos que fazem 
parte da concessão do mercado surgiu esta ideia", explica Francisco 
Mira. E para quem aposta nos enchidos e queijos - o ex-líbris é o 
presunto DOP de Barrancos - é de salientar que falamos de um negócio de 
atletas. Agronomia é o clube actual deste internacional de râguebi, que 
tem rivalidades na vizinhança. "É curioso, os donos da hamburgueria 
[Ultry] são os dois do CDUL e - Francisco e os dois sócios - mas já 
jogámos todos juntos na selecção. Este sábado vamos defrontá- -los. Tem 
sido bastante divertido, estamos sempre a brincar", confessa. 
Brincadeira? Vá por nós caro leitor, cuidado com as placagens.
.COM VIZINHOS ASSIM Até
 dá outro gosto trabalhar. Até porque não é preciso criar ódios de 
estimação com todos os vizinhos, já basta aquele que abusa do volume das
 colunas. E essa sinergia própria entende-se noutros exemplos. Até 
porque a partilha, além de bonita, desenrasca.
David Igrejas é a 
face do Joe's Shack, o quiosque americano de serviço. A primeira coisa 
que faz à chegada é dirigir--se à banca do peixe e pedir uma valente 
remessa de chocos para os seus Fried Squid (choco panado). Prova 
suficiente das práticas auto-sustentáveis da comunidade deste mercado e 
da convivência saudável entre inquilinos. "Vivi dez anos em Miami e 
sempre tive a ideia de abrir algo tipicamente americano. O que nos 
interessou foi explorar um conceito descontraído, de finger food. Lá 
[EUA], isto chama-se Sports Bar, ir trincando qualquer coisa e ver 
desporto. Sou o maior fã desse número", explica.
A arma secreta, 
segundo David, são as asas de frango com aipo e molho bluecheese, entre 
outros (picante, barbecue, alho e mel ) - servidas em pacotes de 12 
unidades (7€) e 24 unidades (13€).
OS OLHOS TAMBÉM COMEM... Avisámos
 na entrada do texto e repetimos o alerta: isto vai virar moda. Afinal 
de contas está inserido num dos mais populares (entenda-se concorridos) 
bairros de Lisboa - basta pensar-se que a conceituada revista "Monocle" 
elegeu, na sua edição de Novembro, Campo de Ourique como o "best 
inner-city suburb", num artigo em que destaca os melhores bairros em 
seis grandes cidades. Além disso, toda a nova decoração é traiçoeira, os
 quiosques são uma mistura entre o tradicional e o chique (que é como 
quem diz "fino mas do povo"), com aqueles letreiros que hoje em dia 
vendem hambúrgueres a torto e a direito. Vitrinas grandes, que chama 
clientes só com um olhar. É sempre uma boa táctica.
Repare-se 
(fotografia número 1) o que nos fazem. Largam mariscos a monte mesmo ali
 e nós que nos aguentemos, está bem está, bem se sabe que os olhos 
também comem. Pedro Coelho é o dono do Mercado do Marisco, que alia a 
marisqueira a uma champanheria, que nos explica o truque para abordar o 
mercado. "Nada de se fazer uma refeição completa, é mais o vaguear pelo 
mercado, um bocado à imagem do que se faz noutros. Uma pessoa ir picando
 entre ir à carne, comer uma sopa e um marisco, uma salada. O interesse é
 que os clientes explorem", confessa.
As gambas (5€ a dose) a sopa
 (2,5€) e o recheio de santola (2,5€) são as especialidades da casa, que
 ainda se atira para os pregos. "Como toda a boa marisqueira, que tem de
 ter um prego, nós temos um prego com carne da alcatra", afirma. A 
acalmia na fala de Pedro reflecte o estaminé que quis montar. 
"Pretendemos que este seja um conceito que dê primazia à rapidez e à 
qualidade, funcionar tudo à volta do marisco, a isto juntar o conceito 
de ostras e champanhe. Acima de tudo é uma marisqueira soft, uma coisa 
suave", diz. As obras de preparação é que não devem ter sido coisa 
branda. Com balcões por montar e equipamento para adquirir, baldes e 
pesos que fortaleceram laços. "Sobretudo damo--nos muito bem com os 
vizinhos da frente, fomo-nos conhecendo uns aos outros. Há aqui muita 
malta nova que não sabe o que isto vai dar, como vai correr, mas está 
tudo confiante e com espírito, é meio caminho andado", afirma.
Provas
 Na marisqueira ofereceram uma sopa, mas o timing não era o melhor, aqui
 fica o agradecimento. Mas no quiosque da Gelati di Chef provámos um 
cone de bolacha de fabrico próprio. Carlos Madeira é o chefe de serviço 
que nos explica tudo. "Gelados de boa qualidade com um toque de chefe, 
ou seja, não apenas vender o gelado, mas também vender o conceito e a 
receita, não se trata de agarrar num cone qualquer e pôr uma bola de 
gelado em cima e comer."
Gelados com assinatura, com uma bolacha 
esmigalhada ou umas pipocas em cima de uma bola de chocolate negro, por 
exemplo. Na Gelati di Chef, os preparativos estavam demorados. Às tantas
 aparece o primeiro cliente: uma criança (5/6 anos) surge com uma nota 
de 5€ e pede um waffle com canela, açúcar e topping. Mais nada.
Fonte: ionline
 
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