quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Alface do Rio: Uma padeira moderna na Cidade Maravilhosa

Há meses que a bicicleta de Inês Oneto não passa indiferente no calçadão de Ipanema, no Rio de Janeiro, Brasil. No cesto, a portuguesa leva pão fresco feito em casa, que entrega, por encomenda, aos clientes cariocas.

Inês Oneto, 33 anos, estudou design de interiores mas no final do bacharelato a representação - também fazia teatro amador - falou mais alto. Assim, quando terminou o curso, em 2003, decidiu apostar na especialização e foi estudar teatro para o Rio de Janeiro. Dois anos depois, regressava a Lisboa sem imaginar que o tempo na capital portuguesa tinha os dias contados.

“Casei com um luso-brasileiro e, com a crise e a oportunidade de a empresa do meu marido, o André, ir para o Brasil, não pensei duas vezes.” De regresso à Cidade Maravilhosa, a designer-atriz começou a procurar trabalho em teatro. Como freelancer, tinha tempo de sobra, por isso decidiu regressar a um hábito que tinha quando estava a viver em Lisboa: fazer pão em casa. “Tinha comprado uma máquina de fazer pão em Portugal que me custou 50 euros. Então comecei a fazer pão, a levá-lo para os lanches com as minhas amigas... Elas elogiavam muito e insistiam que eu tinha de começar a vender.” 

Mas Inês não queria. “Eu só pensava: estão doidas? O que eu menos queria era ser a portuguesa padeira. Era o paradoxo máximo do português - Manuel, António ou Joaquim - no Rio de Janeiro.”
Só que as duas amigas tanto insistiram que acabaram por conseguir convencê-la. “Na altura, lembro-me que lhes disse que elas iam ser as minhas únicas duas clientes.” Mas enganou-se.

Em janeiro deste ano, começou a fazer pão para vender e criou a Alface do Rio. Desde o início do ano, Inês Oneto faz pães de 50g ou de 500g, de seis sabores diferentes, todos com farinha integral - a que depois junta alecrim, passas e canela, frutos secos (um mix de castanhas), linhaça ou azeitonas. Além destes, na versão mais pequena tem ainda uma receita especial, feita com cacau e gengibre.

No final do primeiro mês, Inês tinha vendido 50 pães. “Não queria acreditar. Comecei a fazer pão sem qualquer pretensão mas percebi ao fim do primeiro mês que não se tratava de um défice momentâneo de produto - porque no Rio a oferta é muito reduzida -, mas que o negócio da Alface do Rio oferecia mesmo um serviço único: fazer o pão e entregá-lo aos clientes. Para mim o pão é alquimia. É um templo. Tem que ver com dedicação, com construir qualquer coisa para outra pessoa. 

É como o teatro, exige trabalho, há uma simbiose, é como construir uma personagem ao juntar todos os ingredientes. Percebi então que fazer pão também era parte do meu equilíbrio. É um ritual. A Alface do Rio é um ritual”, confessa ao Dinheiro Vivo, entre entregas a clientes. Para criar a empresa, investiu até agora pouco mais de 3 mil euros (cerca de 10 mil reais). 

O negócio não foi muito pensado, conta Inês Oneto. Na verdade, as coisas foram acontecendo: à medida que surgia uma oportunidade, ela reagia. Foi assim também no caso da Q.guai, uma loja de roupa que entretanto se transformou em galeria e café. Inês foi convidada para vender aí o pão da Alface do Rio, o que a levou a ter de reorganizar a mecânica das entregas aos clientes. 

“Quando percebi que havia um lado bom do negócio foi doloroso. Tive de pedir conselhos e de ter lições com o meu pai por Skype. Tudo isso de aprender a fazer as coisas, a gerir o espaço e a logística da minha cozinha. Não tracei uma meta, vou estruturando à medida que as coisas vão surgindo. Mas é boa a sensação de que consigo formar um negócio a partir de uma ideia. Significa que consegui sair da minha zona de conforto”, conta. 

Há meses que Inês Oneto coordena os ensaios de teatro com as receitas de pão, na cozinha. Enquanto amassa e espera que a massa levede, vai pensando em como pode fazer crescer a sua marca. “Vejo a Alface do Rio como muito mais do que uma simples marca de pão, como uma marca de alimentos saudáveis. E tem sido muito interessante porque no Brasil, quando se fala em coisas integrais, os olhos das pessoas brilham. Eu quero que o pão que vendo se torne um ritual de bairro, que integre rotinas das pessoas, dos meus clientes. A ideia do negócio da Alface do Rio passa, além do pão, por produtos que sejam bons para a saúde.”

E num breve futuro os planos passam também por trocar a bicicleta por uma carrinha Pão-de-Forma, acrescenta Inês Oneto.   


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